Muitos foram os mestres e praticantes de forma geral que
através de seus esforços serviram de ponte para a capoeira ser o que é hoje.
Alguns ganharam notoriedade nesse universo e se tornaram a personificação da
história dessa arte. Já outros, trabalharam quase que anonimamente mas não de
forma menos importante para o desenvolvimento da capoeira.
Sempre que a questão abordada é a Capoeira Regional, sem o
menor esforço lembramos imediatamente de Manoel dos Reis Machado o genial
Mestre Bimba. Bimba com habilidade impar fez uma série de manobras para inserir
a capoeira, ou em um primeiro momento a luta regional baiana no cenário
sociocultural da época.
Um personagem chave nesse processo foi José Sisnando Lima
conhecido na capoeiragem pelo sobrenome de Sisnando.
Sisnando nasceu em Crato no Ceará, e em decorrência das
dificuldades locais somadas ao clima difícil da região, foi o único sobrevivente
de cinco irmãos. Forte por destino, aos 14 anos já era considerado o homem mais
forte da sua cidade. Tinha duas coisas em mente, estudar medicina e trabalhar
com agricultura.
Em suas andanças foi praticante de jiu-jitsu, e ao chegar a
Bahia para estudar medicina se interessou pela capoeira que já se ouvia falar
em outros cantos do Brasil. Muito procurou aquela capoeira que lhe foi relatada,
onde o sujeito capoeirista enfrentava outro armado de faca e ainda levava
vantagem. Não achou!
Falando de sua procura ao cozinheiro da pensão onde morava,
o mesmo lhe disse que sabia o que estava procurando e o levou para conhecer um
tal de Bimba, negro alto e forte que trabalhava como carvoeiro. Bimba ainda não
era afamado, e a princípio relutou em ensinar capoeira a Sisnando dizendo que
aquilo era coisa de preto e não de branco. Sisnando insistiu, e Bimba propôs um
teste, o lendário desafio do colar de força. Sinando então submeteu seu pescoço
ao apertar do braço de Bimba por três minutos... Resistiu... ai não teve jeito,
Bimba teve eu lhe ensinar a capoeira.
Sisnando então passa a ser um expoente da capoeira em outras
camadas sociais, principalmente a de universitários estudantes de medicina. Conjuntamente
a essa maior aceitação, Bimba com a influência direta de Sisnando insere outros
golpes na tradicional capoeira, cria um método de ensino, introduz a formatura,
a festa do batizado, e ainda muda o nome de capoeira para Luta Regional Baiana.
Tudo isso não pensando descaracterizá-la ou em transformar a capoeira em outro
algo como muitos dizem, e sim para fugir dos termos da lei que proibiam a
capoeira.
Em um segundo momento, Sisnando por identificação política
ou geográfica passa a fazer militâncias fervorosas para o então interventor do
governo da Bahia Juracy Magalhães, que também tinha as suas raízes no estado do
Ceará. Em certa passagem em uma manifestação contra o interventor, Sisnando
sobe em um palanque portando um punhal e coloca manifestantes avessos a Juracy
para correr. Ah segundo o próprio Sisnando, o punhal foi presente de Lampião
antes que ele deixa-se o Ceará.
Juracy Magalhães sabendo do empenho desse jovem manda que o
localizem e daí nasce uma grande amizade. Pouco tempo depois Sisnando assessora
algumas atividades do interventor e vai morar no palácio do governo.
Essa proximidade de Juracy e Sisnando abre as portas para
Bimba levar a capoeira ao palácio do governo. A partir daí, a capoeira ganha
autorização legal para sua prática em lugares fechados. Bimba recebe o título
de Instrutor de Educação Física e ainda a autorização para o funcionamento de
sua academia sob o nome de Centro de Cultura Física e Capoeira Regional.
Além disso, Sisnando também provou o seu valor como
capoeira, em diversas rodas era testado por ser o homem branco de Bimba e nunca
decepcionou. Em certo feito, visitou uma academia de judô e karatê na Bahia,
afirmou que a capoeira era a mais eficiente das lutas e foi prontamente
contrariado pelo mestre do local. Então desafiou o mestre dizendo que
enfrentaria os seus 3 melhores alunos ao mesmo tempo, e que depois de derrubar
o terceiro, o primeiro ainda não haveria se levantado. Dito e feito!
Sem dúvida nenhuma o lugar de destaque e a aceitação da
capoeira em diversas camadas sociais se deve a habilidade, originalidade,
conhecimento e liderança de Mestre Bimba. Isso é inquestionável.
Mas não
devemos nos esquecer de muitos que trabalharam arduamente para a ascensão e
perpetuação da capoeira em nosso cenário sociocultural.
José Sisnando Lima é um desses, um dos mais importantes!
Como dizia Mestre Ângelo Decânio “ A Pedra Fundamental”